Minas por Região
Governador

11h47min - 21 de Abril de 2015 Atualizado em 15h52min - 15 de Maio de 2015

Pronunciamento do governador Fernando Pimentel durante a Medalha da Inconfidência

Solenidade ocorreu, nesta terça-feira (21/4), na cidade de Ouro Preto

Tamanho: 6,6 MB

Minhas senhoras, meus senhores,

Que alegria essa praça depois de 12 anos aberta finalmente ao povo poder comemorar o 21 de abril. Que alegria ouvir as vozes da democracia ecoando em Ouro Preto. As vozes da liberdade, ainda que usem as vezes palavras equivocadas, são vozes democráticas, merecem o nosso respeito e nos permitem reafirmar a cada momento os nossos compromissos com a educação, a saúde, a recuperação do serviço público de Minas, a segurança do nosso povo e acima de tudo a liberdade, a justiça e a democracia no Brasil.

Estamos hoje aqui reunidos para celebrar a memória de um homem, de um herói, um mito. Tiradentes repousa no Panteão da História como um personagem além da vida. Representa o ideal sublime e difuso da cidadania. É a encarnação de valores sagrados que podem ser resumidos numa só palavra: liberdade.

Hoje, no entanto, quero lançar um olhar não sobre o ícone Tiradentes, mas sobre a dimensão humana desse vulto e sobre o que ela pode nos ensinar.

Não nos esqueçamos: Tiradentes foi um ser humano como nós, uma pessoa de carne e osso. Alguém que amou e foi amado, que viveu momentos de entusiasmo e de agonia, de esperança e de incerteza, alguém que viu a luz desse mesmo sol, que se encantou com as alvoradas e com os crepúsculos gloriosos da nossa Minas Gerais. Um homem que vive hoje na lembrança eterna, mas que, como todos nós, foi uma chama que um dia surgiu e um dia se apagou.

Não poderia ser mais adequado estarmos aqui, neste momento da história brasileira, reverenciando a figura do Tiradentes. É sua passagem pela vida que deve guiar nossa reflexão de hoje.

Antes de tudo, acima de tudo, acima de tudo, estamos aqui, agora, homenageando um injustiçado. Um brasileiro, um mineiro, que foi vítima da opressão, da mão pesada e cruel daqueles que – deixando a justiça de lado – praticaram a violência sob a capa da legalidade.

Um dia, há exatos 223 anos, aquele alferes caminhou pelas ruas da capital do País em direção à morte. Submetido ao bisonho teatro das conveniências políticas de então, ouviu resignadamente uma sentença lida ao longo de 18 horas. Foi executado na forca infame, seu corpo esquartejado, sua certidão de morte lavrada com seu sangue. Sua cabeça, erguida num poste. Seus despojos distribuídos aos quatro cantos. Arrasaram depois sua morada. Jogaram sal no terreno de sua casa.

Mais de dois séculos depois, o sombrio calvário de Tiradentes  não deve obscurecer nossas mentes. Deve, sim, iluminar nossos corações. Os justiceiros passam. Mas a injustiça é para sempre. Alguém se lembra do nome do executor da sentença contra Tiradentes? Não. Pois quem vive até hoje e viverá sempre na memória da nossa gente é o réu que o tempo e a história transformaram em mártir.

Meus irmãos e irmãs,

Justiçamentos podem ser tudo, menos justiça. Justiçamentos podem saciar a voracidade do arbítrio, podem apetecer a gana das vaidades, mas jamais irão alimentar a fome de justiça.

Tiradentes, o homem, o ser humano, tombou sozinho. Subiu sozinho ao patíbulo. Sofreu sozinho a sua tragédia. Foi punido pela conveniência de não se punir mais ninguém. Foi levado ao altar dos sacrifícios para saciar a sede de vingança dos poderosos da época.

A história desse homem nos ensina que quanto mais seletiva for a punição, mais coletiva será a impunidade.

A conveniência política - momentânea, apaixonada, desequilibrada, viciada pelos impulsos mesquinhos – não patrocina justiça. Ao contrário, a conveniência politica é a irmã do arbítrio e a mãe da injustiça.  Tiradentes é exemplo disso.

Tiradentes foi, a seu tempo, protagonista involuntário de um espetáculo e não de um processo justo. Foi protagonista da busca ardilosa de uma expiação calculada, feita mais para encobrir do que para revelar, feita mais para distrair a razão do que para iluminá-la, feita, enfim, para enganar e não para buscar a verdade.

Senhoras e senhores,

Lembremos a Inconfidência: as acusações, quando a serviço de estratagemas, morrem. Os acusadores morrem. Mas a injustiça contra as vítimas da acusação infundada, essa é eterna, incontornável, irreparável e, sobretudo, imperdoável.

Tiradentes, o herói nacional, terminou a vida no cadafalso, mas permanece vivo na memória. Seus acusadores pereceram no esquecimento e são nota de pé de página no livro da história.

Isso nos mostra que as armações sorrateiras podem se impor durante um período, mas acabam desnudadas pelo passar dos anos e se tornam farsas perante a história.  Ao fim e ao cabo, os difamadores do humilde alferes foram condenados pelo mais implacável dos tribunais: o tribunal do tempo.  E ele, o Tiradentes, agora mártir, absolvido pela eternidade.

Minhas senhoras, meus senhores,

Quero transmitir a todos os condecorados nesta oportunidade minha sincera expressão de respeito. Esta comenda é o mais alto reconhecimento do governo de Minas Gerais e do povo mineiro aos elevados serviços prestados por todos os senhores e senhoras agraciados.

Não posso deixar de ressaltar, todavia, o principal agraciado: o ministro Ricardo Levandowski. Quis o destino que estivéssemos hoje homenageando com o Grande Colar da Ordem da Inconfidência um homem cuja trajetória pública dialoga com o tempo presente e também com todos os tempos. Como numa reverberação de círculos concêntricos, esta cerimônia faz parte de um grande e eterno ciclo também chamado de história.

O ministro Levandowski já se mostrou fiel a mais sublime e nobre missão de um magistrado: ter a coragem de ir contra os aparentes consensos, guiado apenas pela solitária e genuína convicção da inocência ou da culpa, mas sem se deixar intimidar pelos clamores de um, de outro, ou de qualquer lado. Guiado, senhor ministro, pelo incomparável senso da justiça e pelo compromisso republicano e democrático que caracteriza Vossa Excelência.

O magistrado que representa a mais alta corte do País, ao receber a honraria com a marca de um injustiçado, nos evoca também alguns discernimentos.

E aqui me permito avançar no território do nosso homenageado, território jurídico, sem qualquer pretensão a não ser a de externar a preocupação cidadã de quem já foi réu, julgado e condenado pelas leis de exceção do regime autoritário, e que hoje, abençoado pela democracia e ungido pelo voto popular, ocupa o mais honroso posto que um mineiro pode almejar: o de governador do nosso Estado.

Creio, ministro Levandowski, que no processo judicial a acusação deve e tem de ter amplos poderes. Amplos, é claro, também devem ser os direitos da defesa. Mas o julgar bem, o julgar sem viés, os limites da imparcialidade, esses não devem ser amplos, devem ser infinitos.

Há tempo de acusar, há tempo de defender, mas o tempo da justiça deve ser guiado pelo eterno porque a injustiça, como aquela praticada contra Tiradentes, a injustiça é perene.

Por isso, o devido processo penal não pode ser atropelado pela ansiedade do condenar, do execrar, do justiçar. Pois quando uma sociedade se rende aos impulsos primitivos da vingança, ela se rebaixa e renuncia ao que chamamos de civilização.

Todo réu é inocente até que sejam esgotadas todas as possibilidades de defesa. Isso não é um mantra contra os desmandos. É sim, um limite contra os desmandos, como aquele que afligiu Tiradentes.

Um sistema jurídico perfeito não é aquele que se alimenta do estardalhaço. É aquele que silenciosamente não teme encarar os fatos e apenas os fatos – e não as versões – e construir as sentenças com serenidade e isenção.

Os mineiros, caro ministro Levandowski, como bem sabe Vossa Excelência, somos moderados por natureza. Na nossa cultura política sobressaem vultos como Milton Campos, como Tancredo Neves e como Juscelino Kubitscheck, para citar apenas os do século XX, moderados sem dúvida, mas que nunca se curvaram à tirania. Temos em Minas Gerais sempre presente aquilo que João Pinheiro, senador e governador desse estado, chamava de “o grave senso da ordem”.  Ordem democrática, porque baseada no voto popular, e ordem republicana, porque baseada nas leis e na justiça independente e soberana, como independente e soberano é o tribunal que Vossa Excelência dirige hoje.  Ordem, que impõe e exige equilíbrio e moderação na conduta dos homens públicos.  Equilíbrio e moderação, virtudes caras aos mineiros, são também características da atuação e da personalidade do nosso principal agraciado, ministro Ricardo Levandowski.

Para encerrar, noto que a mais alta distinção do dia de hoje, o Grande Colar, repousa na mesma região do corpo em que, no passado, as cordas ásperas da forca e da opressão um dia também já repousaram.

Essa constatação singela mostra que o poder pode servir para fins diametralmente opostos. Podemos usá-lo para julgar com o equilíbrio ou para condenar com a paixão. Para olhar com isenção ou para nos cegarmos com o preconceito. Para imolar inocentes ou para absolver sem temor. Para destruir, derrubar, retaliar ou para, ao contrário, construir, abrigar, pacificar.

Que o equilíbrio e a moderação presidam sempre os poderes da nossa república: esse o desejo de Minas Gerais, esse o desejo de todos os brasileiros.

Reverenciemos nosso mártir, e inspirados no seu exemplo, busquemos a liberdade através da justiça, serena, segura e isenta.

Viva o Tiradentes!  Viva  Minas Gerais!  Viva o Brasil!

Muito obrigado!

SEGOV - Secretaria de Estado de Governo de Minas Gerais

Desenvolvido por marcosloureiro.com

Cidade Administrativa Presidente Tancredo Neves

Rodovia Prefeito Américo Gianetti, 4001
Edifício Gerais, 1º andar
Bairro Serra Verde - BH / MG
CEP: 31630-901
Tel.: +55 31 3915-0262

Telefones de Contato